quinta-feira, 28 de maio de 2015

QUEM NÃO SABE REZAR...

A Bahia fervia em sagrados louvores no Pelourinho.

Junho chuvoso.

Era a trezena de Santo Antônio (na verdade era o tríduo, pois eram três dias e não treze, porém, sabemos que baiano é um povo assuntado).

Antes da procissão sair, na hora da ladainha em honra à Santa Maria, as santas beatas já estavam mais aporrinhadas que xerelete no anzol.

A pendenga era o povaréu, mais acostumado com atabaques do Opofonjá do que os castos sacramentos da Madre Igreja.

Eram mais chegados a uma mumunha pra Ossãe do que uma ladainha pra São Lázaro.

Mais ligados na fila festiva para os comes-e-bebes do olubajé com os quitutes servidos na folha da mamoneira (e tudo pra ser comido com a mão) do que a fila circunspecta e contrita da eucaristia, com a sua hóstia e um tiquinho de vinho. Uma merreca. Monsenhor Alípio, sovinas, colocava sangria pros fiéis bebericarem, ao passo, que ele sorvia um tinto do Porto, direto da Vila Nova Gaia, às margens do Douro.

E o povão, sincreticamente, fervia. Bolinho de acará mergulhado no dendê borbulhante já virando acarajé.

E pra indignação das velhas beatas, a massa estava mais pro bom iorubá do que pro lírico latim, e foi nessa que a turba repetindo, o Frei Cosmo, pároco, representante da Diocese de Salvador, na ladainha em honra à Virgem Maria:

 "Regina Coeli, Aleluia, Regina profetarum

  ( e em vez de profetarum, fizeram ecoar um: bofetarum)".

Era só o prenúncio do furacão. Procissão iniciada. Louvores a Santo Antônio, o Santo Casamenteiro.

Teve beata que quase infartou quando chegaram no trecho da ladainha que diz assim:

"Agnus Dei qui tollis peccata mundi".

Do povão se fez ouvir, em uníssono:

"Agnus dê clitóris peccata mundi".

E Monsenhor Alípio, lívido e estarrecido, virou-se e bradou taxativo uma frase lapidar.

- QUEM NÃO SABE REZAR, XINGA A DEUS!!! (E assim nascia a expressão popular)


Ricardo Bispo

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